Agência Brasil explica: negociações em torno dos precatórios

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Um termo que mistura Justiça e finanças públicas tem ocupado espaço no noticiário econômico nos últimos meses. Estimados em R$ 89,1 bilhões no próximo ano, os precatórios para 2022 têm provocado oscilações no mercado financeiro porque diversas propostas para parcelar o volume a ser pago estão sendo interpretadas pelos analistas financeiros como violações do teto de gastos e tentativas de adiar gastos obrigatórios.

Definidos como dívidas do governo reconhecidas pela Justiça, os precatórios só são determinados por sentenças transitadas em julgado, quando não cabe mais recurso. Um cidadão que processa o governo por qualquer motivo, normalmente em ações que se arrastam por anos, conquista o direito de receber o dinheiro pedido, sempre acrescido de correção com base no tempo em que a ação tramitou na Justiça.

Essa dinâmica ocorre na União, nos estados e nos municípios, com os precatórios sendo incorporados ao passivo (obrigações) do respectivo ente público. No entanto, os precatórios têm diferenças em relação aos títulos públicos, quando o governo pega dinheiro emprestado dos investidores e devolve no vencimento com alguma correção.

Sem prazo determinado, os precatórios só se transformam em gastos públicos no fim de cada processo, o que aumenta a incerteza em relação ao volume a ser executado ano a ano. As estimativas cabem à Advocacia-Geral da União e ao Conselho Nacional de Justiça, que repassam as informações à equipe econômica na elaboração do projeto do Orçamento do ano seguinte.

Para anos posteriores, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) traz uma projeção de precatórios num quadro destinado a avaliar os riscos fiscais de médio prazo. O Balanço-Geral da União também apresenta uma avaliação sobre o tema.

Aumento

Em 2022, será consumado um dos riscos previstos nos últimos anos. O volume de precatórios saltará de R$ 55,4 bilhões neste ano para R$ 89,1 bilhões no próximo. Em tese, a questão não representaria problema para o governo, porque a alta da inflação ampliou o teto federal de gastos. De julho de 2020 a junho de 2021, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou 8,35%, o que abriu uma folga de R$ 136,6 bilhões no teto do próximo ano.

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Enviado ao Congresso em 31 de agosto, o projeto da Lei Orçamentária de 2022 prevê que essa folga será integralmente consumida no próximo ano. Isso porque, além dos precatórios, haverá o impacto do reajuste dos benefícios da Previdência Social, que são corrigidos pela inflação e consumirão R$ 52,7 bilhões da folga do teto, e de outras despesas, como o Benefício de Prestação Continuada, o seguro-desemprego e o abono salarial.

A consumação de toda a folga do teto de gastos põe em xeque o plano do governo de ampliar o Bolsa Família e criar o Auxílio Brasil, que pretende aumentar de 14,7 milhões para 17 milhões o número de famílias atendidas e elevar o valor médio do benefício, atualmente em R$ 190. Para tirar do papel o novo programa social e abrir espaço no teto, o governo quer diminuir o volume de precatórios a ser pago no próximo ano.

Em agosto, o governo enviou ao Congresso uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para parcelar precatórios de grande valor em até dez anos. A PEC também prevê a criação de um fundo de receitas de privatizações, venda de imóveis e de royalties do pré-sal para custear parte do Auxílio Brasil, com despesas supostamente fora do teto de gastos.

A proposta foi mal recebida pelo mercado, intensificando a alta do dólar e a queda da bolsa nas últimas semanas. Para boa parte das instituições financeiras, o parcelamento pode ser interpretado como um calote na dívida pública. O fundo formado por receitas representaria, na avaliação dos analistas de mercado, uma tentativa de driblar o teto de gastos.

Negociações

Cerca de 50 dias após o envio do texto ao Congresso, a comissão especial da PEC dos Precatórios foi instalada hoje (21) na Câmara dos Deputados. O acordo mais recente prevê o estabelecimento de um teto de aproximadamente R$ 40 bilhões para pagamento dos precatórios no Orçamento do próximo ano, mantendo a fatia dos precatórios nas despesas sujeitas ao limite de gastos em 2016, quando foi promulgado o teto.

Os cerca de R$ 50 bilhões restantes seriam transferidos para 2023 ou pagos por meio de negociações que não envolvem desembolso direto de recursos da União, como liquidação do crédito em outorgas, compra de ativos e transações entre devedor (União) e credores.

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A ideia é semelhante à apresentada em agosto pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux. Ele sugeriu a edição de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que congelaria o valor dos precatórios do próximo ano ao equivalente ao da promulgação do teto de gastos em 2016, corrigidos para valores atuais. O que excedesse esse valor só seria pago em 2023.

Sugestões

Recentemente, especialistas apresentaram sugestões para pagar integralmente os R$ 89,1 bilhões de precatórios em 2022 e abrir algum espaço no teto de gastos. Uma das propostas prevê o reconhecimento dos precatórios relacionados ao Fundef, antigo programa de distribuição de recursos para a educação. A emenda constitucional do teto de gastos exclui o Fundeb, programa que substituiu o Fundef, do limite, o que liberaria aproximadamente de R$ 16 bilhões.

O entendimento de que os precatórios do Fundef estão incluídos no Fundeb é defendido por especialistas. Entre os quais, Elida Graziane, procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, e o economista Daniel Couri, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão consultivo do Senado.

A IFI sugere outras soluções que liberariam ainda mais recursos para o teto de gastos sem a necessidade de parcelamento dos precatórios. Segundo o economista Felipe Salto, também diretor do órgão, caso a inflação de 2021 feche o ano em 8,35%, haveria uma folga adicional de R$ 15 bilhões no teto de gastos. Esse é exatamente o valor estimado para o IPCA em 2021 pelas instituições financeiras no Boletim Focus, pesquisa semanal divulgada pelo Banco Central.

O veto ao reajuste do fundo eleitoral para as eleições de 2022 e a não concessão de reajustes ao funcionalismo público no próximo ano completariam as medidas. Dessa forma, na avaliação de Salto, haveria um espaço de R$ 32,1 bilhões aberto no teto de gastos no próximo ano.

Edição: Aline Leal

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ECONOMIA

Cooperativismo inclui pequenos produtores no mercado, diz ex-ministro

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O cooperativismo rural foi um dos temas centrais dos debates do primeiro Encontro de Líderes Rurais que ocorre esta semana na Costa Rica, promovido pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). “É uma solução extraordinária para incluir no mercado produtores pequenos e até médios que, individualmente, seriam expulsos e excluídos do mercado”, defendeu o coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil, Roberto Rodrigues, que participou do encontro de forma remota.

No Brasil, de acordo com a Organização das Cooperativas Brasileiras, Sistema OCB, 54% da produção agrícola vêm de cooperativas. O país é considerado um modelo nesse quesito. Isso não significa, no entanto, que todos os problemas estejam resolvidos e que não haja desafios tanto de produção e organização quanto burocráticos. A conversa com Rodrigues foi uma das mais aguardadas, pois em toda a América, de acordo com os líderes que participam do encontro, sobretudo para os pequenos produtores, as cooperativas apresentam-se como forma de organização.

Rodrigues define o cooperativismo como “doutrina que visa corrigir o social por meio do econômico”. A cooperativa rural é associação de produtores para que possam, juntos, comercializar os produtos e ter acesso a serviços e mesmo a máquinas que, sozinhos, não conseguiriam. “A cooperativa oferece ao cooperado condições que individualmente não teria condições de resolver”, diz Rodrigues. “As cooperativas agregam pequenos, transformando-os, em conjunto, em produtor que compete com grandes”, acrescenta.

As situações são diferentes nos países, mas um ponto comum é que o cooperativismo não é tarefa fácil. Para a secretária de Agricultura Familiar de Betânia, no Piauí, Francisca Neri, uma das líderes que representam o Brasil no encontro, o cooperativismo é a solução para a região onde vive, mas é preciso que os mais jovens aprendam e também se entusiasmem sobre a forma de organização. “Como nós vamos fazer as pessoas entenderem que o associativismo e o cooperativismo são os negócios do futuro, que estão acontecendo no presente e que a gente enquanto agricultor não pode ficar de fora?”, questiona. Ela defende que o cooperativismo seja ensinado nas escolas.

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Em Honduras, segundo a líder Eodora Méndez, o desafio é que os produtores permaneçam na cooperativa. “Muita gente pensou que cooperativismo era organizar-se e receber benefícios. É mais que isso, é trabalhar em conjunto, aglutinando a produção e poder comercializar. Muita gente se retirou e somos poucos os que estamos em cooperativa. Muita gente jogou a toalha, mas estamos lutando sempre para que as cooperativas se mantenham”, diz.

Eodora pertence ao povo originário Lenca e vem de uma família que se dedica ao cultivo de grãos e hortaliças. Foi presidente da Empresa Campesina Agroindustrial de Reforma Agrária de Intibucá (Ecarai), uma organização rural com visão empresarial que representa comunidades de uma das zonas do Departamento Intibucá. Seu trabalho impacta 325 pequenos agricultores. “Quando nos organizamos, temos alternativas de produção, podemos vender a preços melhores e é preciso que isso funcione para que sigamos ativos”, defende.

A líder brasileira Simone Silotti, defende que sejam criadas formas de facilitar a participação dos próprios associados e a articulação entre cooperativas. Ela sugere a criação de uma plataforma “para dar transparência à cooperativa, acompanhar as contas a pagar e a receber sem ter que esperar a prestação de contas. Podemos ter outras abas nessa plataforma para levar conhecimento e formação, inclusive para líderes de cooperativas que quase sempre são pequenos produtores”, afirma.

Silotti é uma pequena produtora rural, de Quatinga, Mogi das Cruzes, São Paulo, e é criadora do Faça um Bem Incrível, projeto que começou em 2020, em meio à pandemia, que busca reduzir o desperdício rural, direcionando os alimentos que seriam descartados para pessoas em situação de vulnerabilidade. O projeto acabou transformando-se em cooperativa. Ela aponta a burocracia como um dos principais desafios e conta que foram mais de dois anos para que conseguissem se formalizar e acessar políticas públicas como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) do Ministério da Educação.

San José - Costa Rica, 18/04/2024 - Cooperativismo inclui pequenos produtores no mercado, defende ex-ministro. Fotos gerais da plenária. Foto: IICA/Divulgação San José - Costa Rica, 18/04/2024 - Cooperativismo inclui pequenos produtores no mercado, defende ex-ministro. Fotos gerais da plenária. Foto: IICA/Divulgação

San José – Costa Rica – Líderes rurais discutem cooperativismo – Foto IICA/Divulgação

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Roberto Rodrigues apresentou aos líderes as condições para que sejam formadas as cooperativas. Uma delas, segundo ele, é que é necessário que as elas surjam do interesse dos próprios produtores, por isso também é preciso que a sociedade conheça e saiba o que é cooperativismo. “Tem que vir de baixo para cima, como desejo do povo. Toda vez que governos tentaram impor, quando terminou o governo terminou o cooperativismo”, disse. Além disso, acrescentou, cooperativas são como empresas, precisam ser viáveis e é preciso comprometimento dos associados.

Apesar das dificuldades apresentadas, Rodrigues incentivou os participantes: “Temos que lutar todos os dias. Eu dava aula e diziam que eu estava repetindo sempre a mesma coisa. Eu dizia: olha, os padres, nas igrejas, há 2 mil anos falam a mesma coisa. É preciso repetir, repetir”.

O primeiro Encontro de Líderes Rurais promovido pelo IICA na Costa Rica reúne 42 produtores rurais presencialmente e remotamente, que foram reconhecidos pela organização como líderes rurais por causa do trabalho que desenvolvem em suas regiões. Eles representam praticamente todos os países americanos. O encontro ocorre ao longo da semana, promovendo visitas técnicas, consultorias e o intercâmbio de experiências entre as lideranças.

*A repórter viajou a convite do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).

Fonte: EBC Economia

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