Mulheres protestam contra norma do CFM sobre assistolia fetal

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Representantes de entidades que atuam na defesa dos direitos das mulheres participaram, nesta quinta-feira (23), de ato em frente à sede do Conselho Federal de Medicina (CFM), em Brasília. As mulheres protestaram contra a resolução do conselho que proíbe médicos de realizarem a chamada assistolia fetal para interrupção da gravidez em casos de aborto previstos em lei e oriundos de estupro.

A decisão foi tomada no fim de março em sessão plenária e vale para gestações acima de 22 semanas, quando, segundo o conselho, há possibilidade de sobrevida do feto. Conforme definição do próprio CFM, a assistolia provoca a morte do feto, antes do procedimento de interrupção da gravidez, por meio da administração de drogas injetadas no coração dele. Já morto, ele é retirado do corpo da mulher.

“Não admitiremos tamanho retrocesso em nossa cultura, em nossa convivência pessoal e familiar”, disse a articuladora política do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea) Jolúzia Batista, ao alertar que a maioria dos casos de gestação tardia provenientes de estupro e que chegam às unidades de saúde para aborto legal é de meninas menores de idade. “Não vamos admitir gravidez infantil por violência ou estupro.”

Jolúzia lembra que não é incomum que meninas de 10 anos procurem atendimento médico para interromper gestações em estágio avançado – muitas delas, antes mesmo de terem menstruado pela primeira vez. A suspeita de gestação só surge bem mais tarde, quando a barriga já começa a aparecer. “Até que se descubra que aquela dor de barriga ou dor de cabeça são decorrentes de gravidez, ela já está com 20 ou 22 semanas”, explicou.

Representante do Conselho Federal de Serviço Social, Maria Elisa Braga disse que há graves denúncias relacionadas ao trabalho de profissionais de saúde que atendem mulheres e meninas vítimas de estupro e que buscam o aborto legal. “Temos que tomar muito cuidado. Profissionais de área de saúde estão sendo perseguidos, ameaçados”, criticou.

A ginecologista Brunely Galvão confirma os cenários expostos por Jolúzia e por Maria Elisa – tanto a demanda por abortos legais tardias por parte de meninas menores de idade e vítimas de violência quanto as dificuldades de profissionais de saúde em equilibrar o cumprimento da lei e a norma definida pelo CFM.

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“Essas meninas precisam desse procedimento [da assistolia fetal] para acessar o aborto legal. Grande parte das que chegam na unidade de saúde está em gestação avançada – seja pelo próprio estigma da vergonha, por medo dos pais ou de não ser levada a sério. Tem que existir esse procedimento.”

“Esse procedimento é fundamental. A resolução atrapalha o nosso dia a dia, o nosso cotidiano. Quando a gente não consegue oferecer a assistolia fetal, temos que encaminhar a paciente para outro país, geralmente Argentina ou Colômbia. A maioria não tem grana porque a maioria são meninas pobres, periféricas, negras, de zona rural. Aí, temos que recorrer à uma ONG [organização não governamental] ou outras parcerias.”

Entenda

Atualmente, pela literatura médica, um feto com 25 semanas de gestação e peso de 500 gramas é considerado viável para sobreviver a uma vida extrauterina. No período de 23 a 24 semanas, pode haver sobrevivência, mas a probabilidade de qualidade de vida é discutida. Considera-se o feto como não viável até a 22ª semana de gestação.

Para o CFM, diante da possibilidade de vida extrauterina após as 22 semanas, a realização da assistolia fetal por profissionais de saúde, nesses casos, não teria previsão legal. Segundo o conselho, o Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao profissional praticar ou indicar atos médicos desnecessários ou proibidos pela legislação vigente no país.

O conselho defende que, ultrapassado o marco temporal das 22 semanas de gestação, deve-se preservar o direito da gestante vítima de estupro à interrupção da gravidez e o direito do nascituro à vida por meio do parto prematuro, “devendo ser assegurada toda tecnologia médica disponível para sua sobrevivência após o nascimento”.

Justiça

Na última sexta-feira (17), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou a suspensão da resolução aprovada pelo CFM. A decisão foi motivada por uma ação protocolada pelo PSOL. Em abril, a Justiça Federal em Porto Alegre chegou a suspender a norma, mas a resolução voltou a valer após o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região derrubar a decisão.

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Em sua decisão, Moraes considerou que houve “abuso do poder regulamentar” do CFM ao fixar regra não prevista em lei para impedir a realização da assistolia fetal em casos de gravidez oriunda de estupro. O ministro destacou ainda que o procedimento só poder ser realizado pelo médico com consentimento da vítima.

“O ordenamento penal não estabelece expressamente quaisquer limitações circunstanciais, procedimentais ou temporais para a realização do chamado aborto legal, cuja juridicidade, presentes tais pressupostos e, em linha de princípio, estará plenamente sancionada”, concluiu.

A decisão do magistrado será submetida a referendo dos demais ministros da Corte no plenário em sessão virtual que começa no próximo dia 31.

Outro lado

Em nota, o CFM informou que vai encaminhar ao STF “argumentos em defesa da manutenção da resolução”. “A norma foi aprovada pelo plenário da autarquia e publicada no Diário Oficial da União no começo de abril, mas, na sexta-feira, o ministro Alexandre de Moraes decidiu, por meio de liminar, suspender temporariamente seus efeitos”.

“Como em outras instâncias do Judiciário, em que já houve decisão a favor da resolução, o CFM apresentará argumentos sólidos para mostrar a pertinência da norma que, vale ressaltar, não pune, mas defende os direitos da mulher, do feto e da vida”, declarou o presidente do conselho, José Hiran Gallo.

No comunicado, o conselho afirma que a resolução não pretende “fazer oposição ao chamado aborto legal” e é “amparada pela Constituição Federal, que prevê o direito inviolável à vida, sem a submissão de tratamento desumano ou degradante”.

“A norma foi elaborada com base em estudos técnicos e científicos que comprovam que, com 22 semanas, há viabilidade de vida fora do útero. Ou seja, diante dessa possibilidade, a interrupção da gestação implica, para o CFM, um ato ilegal e antiético.”

Fonte: EBC SAÚDE

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Famílias comemoram incorporação de remédio para neuroblastoma ao SUS

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Com as mãos trêmulas e lágrimas no rosto, Laira Inácio comemorou nas redes sociais a recomendação de incorporação do medicamento betadinutuximabe para o tratamento de neuroblastoma de alto risco via Sistema Único de Saúde (SUS). Laira é mãe de Ana Júlia, diagnosticada com a doença aos 7 anos. Após se submeter a tratamentos exaustivos e cirurgias, a menina, já com 10 anos, precisava do tratamento com o betadinutuximabe, que custaria em torno de R$ 2 milhões. A mãe utilizou a internet, alugou carros de som e chegou a acionar a Justiça. Mas o tempo, segundo a própria Laira, foi um inimigo implacável – Ana Júlia faleceu em 2023, antes de ter acesso ao remédio.

“Foi aprovado! O Qarziba [nome comercial do betadinutuximabe] vai ser implementado no SUS. Para que nenhuma criança mais sofra como a minha Ana Júlia e como outras crianças. Estou muito emocionada”, disse Laira, em vídeo postado em seu perfil no Instagram.

Em homenagem à filha, a jovem fundou o Instituto Ana Júlia, com o objetivo de oferecer assistência para crianças com câncer e doenças raras. A entidade, presidida por Laira, também arrecada fundos para a compra de medicações consideradas vitais para crianças em tratamento contra o câncer. “Estou muito feliz! Hoje é um dia memorável, que vai mudar a história do neuroblastoma no Brasil”, completou.

A ginecologista e obstetra Carla Franco também celebrou a recomendação de incorporação ao SUS do betadinutuximabe para o tratamento do neuroblastoma de alto risco. Em seu perfil no Instagram, ela lembrou que o protocolo para a doença no Brasil não era atualizado havia dez anos e destacou o alto custo do remédio.

“A medicação mais cara usada na oncologia pediátrica foi finalmente incluída no SUS”, postou. Além do conhecimento adquirido como profissional de saúde, Carla tem uma filha diagnosticada com neuroblastoma. Chamada Linda, a menina, de apenas 4 anos, já passou por rodadas de quimioterapia, cirurgia para retirada do tumor e dois autotransplantes de medula.

Rio de Janeiro (RJ), 06/09/2024 - Ginecologista e obstetra Carla Franco. Foto: Carla Franco/Facebook Rio de Janeiro (RJ), 06/09/2024 - Ginecologista e obstetra Carla Franco. Foto: Carla Franco/Facebook

Ginecologista e obstetra diz que pacientes do SUS poderão usar o betadinutuximabe no tratamento contra o neuroblastoma – Carla Franco/Facebook

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Nas redes sociais, a médica explicou o que muda, a partir de agora, com a recomendação de incorporação do medicamento na rede pública.

“Na teoria, os pacientes do SUS que não faziam [uso do betadinutuximabe] vão poder fazer. E o plano de saúde tem que cobrir, sem [necessidade de recorrer à] Justiça”, destacou a médica.

A própria Carla enfrentou dificuldades para garantir a cobertura da medicação pelo plano de saúde contratado pela família. Segundo ela, Linda precisava iniciar o uso do Qarziba no dia 8 de julho. Após acionar a operadora em diversos momentos, o tratamento com o remédio foi iniciado apenas em agosto. Há uma semana, a menina concluiu o ciclo de dez dias de administração do betadinutuximabe, recebeu alta médica e já está em casa.

Em janeiro deste ano, a antropóloga e diretora do Ministério dos Povos Indígenas, Beatriz Matos, lançou uma campanha para arrecadar recursos em prol do tratamento do filho Pedro, de 5 anos, também diagnosticado com neuroblastoma. A família já havia vivido outro drama: o pai de Pedro é o indigenista Bruno Pereira, assassinado em 2022.

O menino precisou ser submetido a um transplante de medula. A etapa seguinte do tratamento foi o uso do betadinutuximabe. A mobilização em favor da vida de Pedro revelou o drama de famílias como a de Ana Júlia e a de Linda, além de muitas outras.

O neuroblastoma é o terceiro tipo de câncer mais recorrente entre crianças, perdendo apenas para a leucemia e tumores cerebrais. Figura ainda como tumor sólido extracraniano mais comum entre crianças, representando entre 8% e 10% de todos os tumores infantis. O aumento do volume abdominal é um dos sintomas da doença. Por esse motivo, o tumor pode ser descoberto a partir de queixas da criança relacionadas a dores na barriga ou mesmo incômodo no tórax. Pesquisas mostram que o problema, normalmente, aparece até os 5 anos e pode acometer, inclusive, recém-nascidos.

Neuroblastoma - infográfico sintomas e destaque. Foto: Arte/EBC Neuroblastoma - infográfico sintomas e destaque. Foto: Arte/EBC

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Entenda

Nesta quinta-feira (5), a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) recomendou a incorporação do betadinutuximabe para o tratamento de neuroblastoma de alto risco na rede púbica. Na prática, a decisão significa que o remédio passará a integrar o rol de medicamentos custeados e distribuídos pelo SUS. A condição estabelecida para que a medicação seja administrada na rede pública é que o paciente tenha sido previamente tratado com quimioterapia e alcançado pelo menos uma resposta parcial, seguida de terapêutica mieloablativa e transplante de células tronco.

O pedido de incorporação do betadinutuximabe ao SUS foi submetido à Conitec em janeiro deste ano pelo próprio fabricante do Qarziba, o laboratório Recordati. À época, a farmacêutica defendeu que a medicação fosse indicada para pacientes a partir dos 12 meses de vida, que já tenham sido tratados com quimioterapia de indução e que tenham alcançado pelo menos uma resposta parcial, seguida de terapêutica mieloablativa e transplante de células tronco; e também para pacientes com história de recidiva ou neuroblastoma refratário, com ou sem doença residual.

O laboratório argumentou que o medicamento foi utilizado em estudos clínicos realizados a partir de 2009 em pelo menos 126 centros envolvendo mais de mil pacientes em 18 países. “A imunoterapia anti-GD2, como é o Qarziba, não apenas melhora a sobrevida, como também reduz o risco de que todos os tratamentos anteriores pelos quais esses pacientes passam falhem com recidiva”, detalhou Recordati.

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou o uso do betadinutuximabe em 2021. À época, o medicamento foi indicado pela autarquia para o tratamento de neuroblastoma de alto risco em pacientes a partir dos 12 meses. Como não havia passado pela aval da Conitec ainda, o tratamento com o remédio no país só era possível via rede privada e, conforme relatos de pacientes e familiares, mediante muita insistência junto a operadoras de planos de saúde e processos de judicialização.

Fonte: EBC SAÚDE

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