Especialista aponta recorte racial como prioridade de vacinação

Estudo mostrou que as desigualdades raciais e sociais foram intensificadas pela pandemia de covid-19, levando a um número maior de mortes entre a população negra do Brasil no ano passado. Mortes por doenças – incluindo doenças respiratórias como a covid-19 – aumentaram 18% entre os brasileiros brancos no último ano, enquanto entre pessoas negras o crescimento chegou a 28%. De acordo com especialista, políticas públicas devem considerar a desigualdade racial para o combate à pandemia.
Realizado pela Vital Strategies e pelo núcleo de pesquisa Afro-Cebrap – do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento -, o estudo utilizou o excesso de mortalidade como indicador. O método é usado por epidemiologistas e especialistas em saúde pública para calcular a diferença entre o número de mortes esperadas e o número de mortes observadas em um determinado período e local.
Na análise, foi comparada a quantidade de óbitos por causas naturais esperada em 2020 e a quantidade de óbitos observada para o mesmo ano, revelando que cerca de 270 mil brasileiros morreram acima do esperado no ano passado em comparação com os anos anteriores. Dessas 270 mil, 153 mil ocorreram entre negros e 117 entre brancos, ou seja, foram 30% mais negros dentre as mortes em excesso.
“Se pensar em termos de exposição, você imagina que a população está exposta igualmente. Quando você olha por raça/cor, você vê que não é verdade, que negros – pretos e pardos – estão muito mais expostos aos perigos da pandemia e estão muito mais desassistidos em relação a seus próprios problemas de saúde”, disse Fatima Marinho, epidemiologista que conduziu o estudo e consultora sênior da Vital Strategies.
O estudo foi feito a partir de dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM) e do sistema de informação da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais, além de dados populacionais do IBGE.
Os dados utilizados refletem não apenas os impactos diretos da covid-19 – aumento de mortes pela doença –, mas os indiretos, devido a restrições de movimentação, superlotação de hospitais e unidades de saúde, redução da busca por atendimento médico por parte de doentes graves por medo de se infectar, além do cancelamento ou adiamento de procedimentos médico-hospitalar para doentes graves, devido ao risco de infecção pelo novo coronavírus.
A pesquisadora destaca que desde o nascimento as condições impostas à população negra no país são piores do que à população branca, o que contribui para consequências como maior mortalidade em situações como a pandemia atual. O próprio racismo, segundo a epidemiologista, é um fator estressante que pode desencadear adoecimento. “As pessoas [negras] ficam mais estressadas, elas vivem em áreas violentas, elas sofrem muito mais violência policial se for homem e, se for mulher, sofre abuso mesmo, então vai desenvolvendo nessa população um estresse que vai impactando também na saúde.”
Quando analisados por gênero, os dados mostram que morreram 23,9% mulheres negras a mais do que o esperado, enquanto esse excesso de mortalidade foi de 15,3% entre mulheres brancas. Considerando os homens, o excesso de mortes ficou em 31% para negros e 20% para brancos. Em relação a faixa etária, os dados mostram que pessoas negras até 29 anos morreram 32,9% a mais que o esperado, enquanto brancos na mesma faixa etária morreram 22,6% a mais que o esperado.
“Chamamos isso de uma sindemia, nesse sentido: já está dado para ele [pessoas negras] péssimas condições desde o nascer, na vida e até a morte, por isso ele vai viver menos. E, por isso, agora veio a covid-19 radicalizar realmente essa desigualdade racial no Brasil”, avalia Fatima. Para combater de forma eficaz a pandemia, ela acredita que o poder público deve levar em consideração não apenas o recorte etário, mas o de raça/cor.
Políticas de proteção
A epidemiologista avalia que, mesmo quando se iniciou a política de proteção contra a covid-19, que abrange a vacinação e o isolamento social, as populações negra e pobre ficaram majoritariamente excluídas. “Se você fala que vai fazer um lockdown, quem é que vai pra rua trabalhar? Quem é que tem que pegar trem lotado todos os dias? São os negros principalmente. E aí eu dou mais exposição [à doença] a eles e não tem nem a solução da vacina pra eles porque eles são mais jovens.”, avaliou.
A expectativa de vida é menor entre a população negra, o que faz com que eles acabem excluídos dos grupos prioritários atuais de vacinação, que são os idosos. “Negros são 56% da população brasileira e brancos são 43%. Se você olhar para a faixa etária de 60 anos e mais, inverte: 50% são brancos, 49% são negros. Se chegar na faixa etária de 80 e mais, 75% são brancos, só temos 25% de negros sobrevivendo até os 80 anos”, ressaltou.
Para Fatima, como a expectativa de vida de negros é menor que a de brancos, esse fator deveria ser considerado na implementação de políticas públicas, o que contribuiria para uma redução dessa desigualdade. “Todos os que tem 90 [anos] primeiro, quase não tem negro aí. Os que tem 80 primeiro, também quase não tem negro aí. Então eu [enquanto gestor público] não protejo esse grupo e essa desigualdade se reflete em um impacto muito maior de adoecimento e morte na população negra e eu não tenho nenhuma política para reduzir esse dano.”
Ela afirma que a decisão de vacinar por idade não é baseada na epidemiologia da doença e que é simplesmente uma decisão burocrática. “Se você basear na epidemiologia, você vai vacinar quem tem mais risco”, destaca. Isso significa que não é só a idade aumenta o risco de ter um caso grave ou morte por covid-19, mas também os determinantes sociais. Há também o elemento das regiões mais precarizadas, que estão mais expostas aos riscos e mortes pela doença. https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-02/estudo-indica-que-vacinacao-em-sao-paulo-deve-priorizar-periferia
“Enxergando isso, eu consigo controlar melhor a disseminação do vírus. Está errada a forma como está se fazendo, porque eu tenho que exatamente olhar para onde tem maior circulação viral. O que eu quero controlar com a vacina? A circulação viral. Quanto menos gente estiver transmitindo, eu consigo reduzir a circulação do vírus e então vou reduzir o impacto desse vírus na população em geral”, concluiu a epidemiologista. Ela acrescenta que a vacina não é um instrumento de proteção individual, mas sim instrumento de proteção coletiva.
Edição: Claudia Felczak


SAÚDE
“A saúde integral da mulher é prioridade absoluta do Ministério da Saúde”, afirma Padilha em primeira reunião no Congresso Nacional

No segundo dia à frente do Ministério da Saúde, o ministro Alexandre Padilha realizou a primeira reunião no Congresso Nacional com a bancada feminina da Câmara dos Deputados. O encontro ocorreu nesta quarta-feira (12) e marcou o compromisso do governo em priorizar a saúde das mulheres. “A saúde integral da mulher é prioridade absoluta na gestão do Ministério da Saúde”, defendeu Padilha.
Liderada pela deputada Benedita da Silva, a bancada feminina levou ao ministro sugestões de projetos e medidas para fortalecer o atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). Durante a reunião, Padilha enfatizou a importância de garantir um cuidado ainda mais amplo para todas. “Não dá para falar de saúde sem falar das mulheres, sem envolvê-las no enfrentamento dos desafios do setor. As mulheres são maioria da população e principais usuárias do SUS, seja por conta própria ou como cuidadoras de seus filhos, pais e familiares. Além disso, a maior parte dos profissionais da saúde são mulheres”, destacou o ministro.
A deputada Benedita da Silva (RJ) agradeceu ao ministro pela disponibilidade em dialogar com o grupo e reforçou a importância da parceria para avançar em projetos fundamentais. “A bancada feminina tem trabalhado intensamente e conquistado avanços em diversos projetos. Hoje, na área da saúde, temos três propostas voltadas para o câncer, três relacionadas à saúde mental e psicossocial, duas para acompanhamento em saúde, além de iniciativas específicas para a saúde da mulher negra, combate à violência sexual e regulamentação da profissão de doulas. O que queremos é ouvi-lo, dar-lhe as boas-vindas e reforçar que estamos prontas para construir juntos”, declarou Benedita.
A parlamentar Jandira Feghali (RJ) destacou a importância da participação feminina no debate sobre o Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS) e o incentivo à inovação científica. “A questão da mulher é transversal e, entre os temas discutidos, está o Complexo Industrial da Saúde. Acredito que precisamos acompanhar mais de perto o desenvolvimento desse trabalho, pois há pesquisadores inovando nessa área, o que pode trazer impactos positivos para as políticas públicas de saúde”, afirmou Feghali.
Para Antônia Lúcia, deputada pelo estado do Acre, há necessidade de medidas mais rígidas para garantir a aplicação de vacinas em crianças e políticas voltadas ao tratamento de câncer e saúde mental. “Vossa Excelência terá a oportunidade de se debruçar sobre projetos fundamentais para o combate ao câncer e a manutenção da qualidade de vida das pessoas com deficiência psicológica. Além disso, gostaria de sugerir a criação de uma tipificação criminal para servidores públicos que se recusarem a aplicar vacinas nas crianças”, pontuou a parlamentar.
“Estou muito feliz por vê-lo à frente do Ministério da Saúde. Conheço seu trabalho e a diferença que fez no Governo Federal e na Secretaria de Saúde da capital paulista. Um dos pontos que precisamos discutir é a distribuição de fraldas geriátricas nas UBS”, propôs a deputada Juliana Cardoso (SP).
A deputada Célia Xakriabá (MG) destacou pautas voltadas à saúde indígena e alertou sobre os impactos ambientais na saúde dos povos originários. “Temos duas coisas em comum: o senhor, que é doutor do corpo, e nós, povos indígenas, que somos doutores e embaixadores da floresta. Nesse sentido, temos dois projetos fundamentais. Um deles regulamenta as profissões de Agente Indígena de Saúde (AIS) e de Agente Indígena de Saneamento (Aisan), no âmbito do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS). O outro, de minha autoria, trata dos impactos dos agrotóxicos nas terras indígenas. Vivemos um momento de profunda crise climática, e precisamos discutir de que maneira podemos enfrentar esse problema”, alertou.
O ministro Alexandre Padilha, ao ouvir as parlamentares, destacou que o encontro reforça a parceria entre o Ministério da Saúde e a bancada feminina para impulsionar projetos que ampliem o acesso das mulheres aos serviços de saúde. “Saiu daqui um casamento entre o Ministério da Saúde e a bancada das mulheres. Vou me reunir com a Liderança do Governo na Câmara para avaliar a possibilidade de priorizarmos esses projetos. Vamos fazer de março um mês extremamente produtivo para a saúde integral das mulheres no Congresso Nacional”, afirmou.
Outras importantes iniciativas mencionadas são a instalação de uma sala de situação permanente no Ministério da Saúde para acelerar agendas relacionadas às mulheres, o fortalecimento da Rede Alyne e a ampliação da prevenção e diagnóstico do câncer de colo de útero e de mama. Padilha também destacou que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) discutirá a incorporação de novos medicamentos para o tratamento da endometriose e anticoncepcionais que beneficiem mulheres e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
O ministro da Saúde reforçou, ainda, a importância de reduzir o tempo de espera para exames e tratamentos, garantindo um atendimento mais rápido e eficiente para a população feminina. “Vamos consolidar o Brasil como a maior rede pública de prevenção diagnóstica de câncer do mundo. Temos todas as condições de fazer isso e é uma prioridade absoluta nossa”, destacou.
Edjalma Borges
Ministério da Saúde
Fonte: Ministério da Saúde
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