Guedes nega que haja conflito entre sua atuação e offshore no exterior

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que não há conflitos de interesse entre a atuação dele no cargo e a participação na Dreadnoughts Internacional, offshore localizada nas Ilhas Virgens Britânicas. Ele falou, hoje (23), em audiência pública conjunta das comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público e de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados sobre suas movimentações financeiras no exterior.
“Não há nada mais claro e transparente do que declarar que tem um parente seu lá e ele não está fazendo nenhuma ação que tem conflito de interesse. O que tinha de conflito de interesse no Brasil foi removido”, disse, explicando que se desvinculou de toda a atuação no mercado privado desde que assumiu o cargo de ministro, inclusive do controle da offshore, conforme exigido pela Comissão de Ética Pública da Presidência,
A abertura de contas no exterior e a manutenção de offshores não são ilegais, desde que declaradas à Receita Federal e às demais autoridades. No entanto, o Código de Conduta da Alta Administração Federal proíbe que membros do alto escalão sejam administradores diretos de investimentos estrangeiros no Brasil e no exterior após assumirem funções públicas.
“Fiz um depósito lá fora, 2014 e 2015 quando a empresa foi criada o dinheiro foi para lá. Não houve mais depósitos e não houve remessas para o Brasil. Essa ideia que está ganhando, especulou, com dólar subindo, esquece, não existe isso, são recursos que foram e é parte da sucessão familiar”, completou. De acordo com Guedes, os recursos são administrados por uma plataforma independente de custódia e investidos em ativos “que têm zero a ver com o Brasil”, como fundos de longo prazo. “A minha mão [atuação como ministro] não chega lá”, ressaltou.
Segundo o ministro, a empresa foi criada por decisão pessoal de investir parte de seu patrimônio no exterior, mas sem estar submetido à cobrança de impostos. “Offshore é um veículo de investimento absolutamente legal”, disse.
“Por razões sucessórias, se quiser investir alguma coisa nos Estados Unidos, se comprar ações, se tiver uma conta em nome da pessoa física, se você falecer, 46%, 47% são expropriados pelo governo americano. Mesmo sendo estrangeiro, se fizer investimento na pessoa física, todo seu trabalho de vida, em vez de deixar para herdeiros, vira imposto sobre herança e é apropriado pelo governo. Então, o melhor é usar offshore, usar uma companhia que está fora do continente”, explicou aos deputados.
Pandora Papers
A existência da offshore de Guedes foi revelada em outubro pelo Pandora Papers, investigação de um consórcio internacional de jornalistas com base em documentos vazados de 14 escritórios internacionais de abertura de empresas em paraísos fiscais no exterior. As matérias citam figuras públicas como políticos e até cantores e monarcas.
Segundo as reportagens, a offshore Dreadnoughts Internacional foi fundada por Guedes e por sua filha, a empresária Paula Drumond Guedes, em setembro de 2014. A companhia recebeu investimentos de US$ 8 milhões na abertura e aportes de US$ 1,54 milhão em 2015, totalizando US$ 9,54 milhões.
Além de Guedes, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, também foi citado com participações em offshores. Na ocasião, ambos informaram que as empresas foram declaradas à Receita Federal, ao Banco Central, à Comissão de Ética Pública e às demais autoridades brasileiras competentes e não violam a legislação.
“Vou reafirmar que todos os dados foram entregues, seja minha saída da empresa, seja a permanência de familiar como proprietário dos recursos, que é absolutamente uma obviedade. São recursos que pertencem à família, como um patrimônio, foi colocado lá em 2014, não tem nada a ver com a minha atuação como ministro”, reafirmou. “Como eu podia imaginar em 2014 que ia ser ministro em 2019, que ia ser atingido por um covid [pandemia], que ia empurrar [o dólar] ainda mais pra cima?”, questionou, dizendo que não está no governo “por oportunismo”.
Atuação no governo
O ministro Guedes negou ainda que tenha atuado para elevar a cotação do dólar. Como os valores depositados na offshore estão em moeda norte-americana, os investimentos se valorizam se o dólar aumenta. “Ninguém lutou mais por um Banco Central independente. O poder de determinar taxas de juros, de trabalhar com o câmbio é o BC que tem. Se eu tivesse interesse em fazer alguma coisa, eu ficava com o BC sob meu comando”, disse.
Ele apresentou um levantamento que aponta que, nos últimos três anos, o dólar subiu mais de 2% em 27 ocasiões. “Nenhuma pela Economia. Não houve nenhuma declaração da Economia que fizesse subir 2%. Foi covid, Sérgio Moro sai do governo, ex-presidente Michel Temer é preso; política ou doença que foram os eventos mais contundentes”, disse.
Além disso, no ano passado, o Conselho Monetário Nacional (CMN), do qual Guedes participa, decidiu elevar de US$ 100 mil para US$ 1 milhão o valor mínimo a ser declarado ao BC sobre capitais no exterior. Segundo Guedes, ele não se beneficiou da mudança.
“De novo, está completamente ausente qualquer conflito de interesse”, disse. “Se estou passando para US$ 1 milhão e minha offshore tem mais que isso, em nenhum momento estou me fazendo qualquer favor”, disse.
Guedes também afirmou que a versão original da reforma do Imposto de Renda, enviada pelo Ministério da Economia ao Congresso Nacional, previa a taxação de recursos mantidos no exterior, mas que a proposta foi retirada durante a tramitação pela Câmara dos Deputados. “Tem muita gente por aí com amigo no mercado financeiro, porque derrubaram a nossa proposta de tributar os 60 mil brasileiros que ganham R$ 300 bilhões [com ativos no exterior]”, destacou. “Mas não podemos simplificar entre mocinho e bandido, temos que trabalhar juntos”.
Edição: Aline Leal


POLÍTICA NACIONAL
Câmara começa a discutir projeto que regulamenta a inteligência artificial no Brasil

O projeto de lei 2338/23, que regulamenta a inteligência artificial no Brasil, ainda nem chegou à Câmara, mas já está em discussão na Casa. O Grupo de Trabalho em Inteligência Artificial da Coalizão Direitos na Rede promoveu um debate sobre a proposta, aprovado no Senado em dezembro do ano passado, com a finalidade de aprimorar o texto quando for analisado pelos deputados.
De acordo com Paula Guedes, consultora da organização não governamental Artigo 19 Brasil e integrante da Coalização Direitos na Rede, alguns pontos precisam ser melhorados.
“Alguns pontos de proteção de direitos foram retirados; então, algumas medidas de governança, por exemplo, foram retiradas, as avaliações preliminares para definir o grau de risco foram também flexibilizadas. Agora são boas práticas, mas deveriam ser obrigatórias, para que os agentes saibam quais obrigações eles têm que cumprir ao longo da legislação”, disse.
O texto, que deve chegar à Câmara nos próximos dias, classifica os sistemas de inteligência artificial quanto aos níveis de risco para a vida humana e os direitos fundamentais. Também divide as aplicações em duas categorias – inteligência artificial e inteligência artificial generativa.
Depois de o projeto passar por mudanças no Senado, apenas os sistemas de inteligência artificial generativa e de propósito geral deverão ter avaliação preliminar de risco. Para os demais casos a avaliação prévia será facultativa.
O objetivo dessa avaliação é determinar o grau de risco do sistema, que dependerá de suas finalidades e do seu impacto. A análise deve ser realizada pelos próprios desenvolvedores, fornecedores ou aplicadores do sistema antes da chegado do produto ao mercado.
Proteção a direitos fundamentais
Pela proposta, sistemas considerados de risco excessivo ficam proibidos. Entre eles estão os chamados sistemas de armas autônomas, que podem selecionar e atacar alvos sem intervenção humana. Além disso, o texto veta sistemas que tenham o objetivo de produzir e disseminar material que represente abuso ou exploração sexual de crianças e adolescentes. A avaliação de traços de personalidade e de comportamento para prever crimes também fica proibida.
O uso de câmeras para identificar pessoas em espaços públicos só será permitido em casos específicos, como busca de vítimas de crimes ou pessoas desaparecidas e para recapturar fugitivos. As câmeras só poderão ser utilizadas nos casos de delitos com pena de prisão superior a dois anos, com autorização do juiz e quando não houver outro meio de prova.
A especialista Paula Guedes defende que essas medidas são essenciais para garantir os direitos dos cidadãos.
“Olhar para a regulação de inteligência artificial é garantir que sistemas, que não são só sistemas aplicados às plataformas e redes sociais, tenham proteção de privacidade, contra discriminação, tragam transparência, tragam maior proteção a direitos fundamentais.”
Direitos autorais
O projeto do Senado também trata de direitos autorais no desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial. Pelo texto, conteúdos protegidos poderão ser utilizados livremente somente por instituições de pesquisa, de jornalismo, museus, arquivos, bibliotecas e organizações educacionais. Ainda assim, o material precisa ser obtido de forma legítima e a aplicação não pode ter fins comerciais.
Nos demais casos, o titular de direitos autorais poderá proibir o uso dos conteúdos protegidos. Caso obras sejam utilizadas no desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial comerciais, o titular terá direito à remuneração.
Reportagem – Maria Neves
Edição – Ana Chalub
Fonte: Câmara dos Deputados
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