Opinião

O dois Tomés

No capítulo 20, o Jesus ressuscitado aparece aos discípulos, exceto o ausente Tomé que diz: se eu não vir o sinal dos pregos em suas mãos, e não puser o meu dedo no sinal dos pregos, e não puser a minha mão no seu lado, não acreditarei!

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Mario Eugenio Saturno é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.

Stephen Jay Gould escreveu o livro Rocks of Ages, que eu comprei no lançamento, quase em um lance de sorte. Nesse livro, ele desenvolve a ideia de separar Ciência e Religião pelo magistério.

O livro começa com a história de dois Tomés (ou Thomas em inglês). O primeiro é o discípulo Tomé que é citado três aparições no Evangelho de João, que ajudam a entender os diferentes poderes e procedimentos da ciência e da religião.

A primeira, encontramos Tomé no capítulo 11. Lázaro morreu e Jesus deseja retornar à Judeia para ressuscitá-lo, mas os discípulos hesitam, pois os judeus queriam matar Jesus. E Tomé adianta-se para romper o impasse e restaurar a coragem aos discípulos: vamos também nós para morrermos com ele”.

Na segunda incidente (capítulo 14), na Última Ceia, Jesus afirma que será traído e deve morrer, mas ele irá para um lugar melhor e preparará o caminho: na casa de meu Pai há muitas moradas, vou preparar-vos lugar. Tomé, agora confuso, pergunta a Jesus: Senhor, não sabemos para onde vais; e como podemos saber o caminho? Jesus responde em uma das passagens mais conhecidas da Bíblia: Eu sou o caminho, a verdade e a vida: ninguém vem ao Pai senão por mim.

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No capítulo 20, o Jesus ressuscitado aparece aos discípulos, exceto o ausente Tomé que diz: se eu não vir o sinal dos pregos em suas mãos, e não puser o meu dedo no sinal dos pregos, e não puser a minha mão no seu lado, não acreditarei!

Então veio Jesus, estando as portas fechadas, e pôs-se no meio e disse: Paz seja convosco. Então disse a Tomé: põe aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos; e chega a tua mão e põe-na no meu lado e não sejas incrédulo, mas crente. E Tomé respondeu-lhe: Meu Senhor e meu Deus!

Esta última passagem assume grande importância, pois é a primeira vez que Jesus é identificado como Deus. Os trinitários apontam a declaração de Tomé como prova da natureza tripla de Deus como Pai, Filho e Espírito Santo.
Jesus disse: bem-aventurados os que não viram e creram. Uma atitude cética em relação a apelos baseados apenas em autoridade, combinada com uma demanda por evidências diretas, representa o primeiro mandamento do procedimento científico adequado. Pobre Tomé! Ele agiu da maneira mais admirável para um estilo de investigação, mas no magistério errado. Ele defendeu o princípio-chave da ciência enquanto operava dentro do magistério da fé.

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Portanto, se Tomé, o apóstolo, defendeu as normas da ciência no magistério errado, consideremos outro Tomé, um homem de religião dogmática que invadiu indevidamente o magistério da ciência. O reverendo Thomas Burnet (1635-1715), embora desconhecido hoje, escreveu um dos livros mais influentes do final do século XVII: “Telluris theoria sacra” (A Teoria Sagrada da Terra).

Este livro influenciou por mais de cem anos, incluindo Giambattista Vico, no Scienza nuova, de 1725, a base para estudos históricos de antropologia cultural, e Georges Buffon, na “Histoire naturelle” de 1749.

Depois, Gould defenderá sua ideia de magistério da Ciência e da Fé, a primeira, responsável pelos conhecimentos da natureza e a segunda, com a Ética.

Mario Eugenio Saturno é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.

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ARTIGO

PEC 6X1: oportunidade para o debate franco acerca da legislação trabalhista

A baixa produtividade nacional está também associada a uma qualidade educacional deficiente, fator que dificulta a implementação de uma jornada reduzida sem impacto negativo na produção. O recente relatório da McKinsey sobre o futuro do trabalho destaca que, para competir em um mercado global, é necessário cultivar habilidades de criatividade, autoaprendizado e flexibilidade. O Brasil, com uma educação pública ainda deficiente, precisaria investir significativamente nesses aspectos para que seus trabalhadores pudessem se beneficiar plenamente de uma jornada reduzida e competir em uma economia mundial em transformação. 

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André Naves é Defensor Público Federal, especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social; Mestre em Economia Política.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6X1, de autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), tem como objetivo a redução da jornada de trabalho de 44 para 36 horas semanais, mantendo os salários e reorganizando a carga semanal em até quatro dias. Essa proposta vem ao encontro de tendências globais, onde o debate sobre a jornada de trabalho e sua adaptação aos novos tempos — especialmente com o avanço da tecnologia e da inteligência artificial — tem ganhado força.

A PEC 6×1, inspirada pelo Movimento Vida Além do Trabalho (VAT), idealizado pelo vereador Rick Azevedo (PSOL-RJ), pode ser vista como um ponto de partida para uma análise mais profunda sobre o sistema trabalhista brasileiro e suas limitações, tanto para trabalhadores quanto para empregadores.

A questão da jornada de trabalho reduzida é sustentada por um contexto de aumento da produtividade, impulsionado pelas inovações tecnológicas. Essas inovações permitiram que, em alguns setores, menos horas de trabalho resultassem em níveis de produção iguais ou superiores aos modelos tradicionais. No entanto, a discussão sobre a redução da jornada de trabalho não se limita aos ganhos de produtividade. Ela também envolve uma série de outros fatores, como qualidade de vida, saúde mental, e até mesmo a busca por um equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

Em termos práticos, a PEC 6X1 procura responder à demanda por uma jornada de trabalho que promova o bem-estar dos trabalhadores sem sacrificar o desempenho econômico. Entretanto, há obstáculos no que diz respeito à aplicabilidade da medida no contexto brasileiro. O arcabouço jurídico trabalhista do país, com regulamentações amplas, visa proteger o trabalhador, mas frequentemente é apontado como um fator que engessa a iniciativa privada e dificulta a criação de empregos.

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A complexidade e os custos associados ao cumprimento das leis trabalhistas brasileiras muitas vezes desestimulam empresários, especialmente os pequenos e médios, de contratar formalmente. O excesso regulatório pode ser, em parte, responsável pela baixa produtividade e pela informalidade ainda presente no mercado de trabalho brasileiro.

Além disso, o Brasil já enfrenta desafios específicos em relação ao mercado de trabalho, como a escassez de mão de obra em algumas regiões e o aumento da informalidade. Há também uma pressão social crescente para ajustar programas de assistência, como o Bolsa Família, para que realmente sirvam como apoio temporário, incentivando a entrada no mercado de trabalho. Isso alinha-se à célebre frase do ex-presidente americano Ronald Reagan, para quem “o melhor programa social é o emprego”. Nesse sentido, um mercado de trabalho desburocratizado e uma política de assistência social orientada para a autonomia individual poderiam ser fundamentais para garantir uma economia mais forte e inclusiva.

A baixa produtividade nacional está também associada a uma qualidade educacional deficiente, fator que dificulta a implementação de uma jornada reduzida sem impacto negativo na produção. O recente relatório da McKinsey sobre o futuro do trabalho destaca que, para competir em um mercado global, é necessário cultivar habilidades de criatividade, autoaprendizado e flexibilidade. O Brasil, com uma educação pública ainda deficiente, precisaria investir significativamente nesses aspectos para que seus trabalhadores pudessem se beneficiar plenamente de uma jornada reduzida e competir em uma economia mundial em transformação.

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A PEC 6X1, assim, abre uma oportunidade rara para rever os princípios que sustentam o sistema trabalhista brasileiro e questionar se esse modelo atende às necessidades contemporâneas de um mundo em rápida mudança. Trata-se de uma chance para empreender uma reforma que, ao mesmo tempo que preserva a dignidade dos trabalhadores, valorize a iniciativa privada e encoraje a criação de empregos de qualidade. Como se diz, “quando o cavalo selado passa, é hora de pular e aproveitar a chance”.

André Naves é Defensor Público Federal formado em Direito pela USP; especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social; mestre em Economia Política pela PUC/SP; cientista político pela Hillsdale College; doutor em Economia pela Princeton University; escritor e professor (Instagram: @andrenaves.def).

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